terça-feira, 1 de setembro de 2009

Uma cesta de exigências indevidas em concorrência promovida pelo INSS

Mediante o Acórdão 1735/2009, Plenário, do TCU, foi apontada uma seqüência de exigências indevidas, abusivas, feitas numa concorrência promovida pelo INSS, em Minas Gerais.
Vale transcrever o voto do Relator do processo no TCU, com vistas a que as empresas consigam visualizar os abusos e se proteger de situações apresentadas em editais como esse.
Veja-se a parte importante do voto do Relator e do que restou acordado nesse julgamento:
“...
4. A exigência de que somente poderão participar da Concorrência 2/2008 as empresas devidamente cadastradas e habilitadas parcialmente no SICAF contraria as disposições do art. 22, § 1º, da Lei 8.666/1993, que define concorrência como a modalidade de licitação entre quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto. Essa matéria já foi objeto de apreciação por parte desta Corte de Contas, conforme Decisões 654/2000-TCU-Plenário e 20/2001-TCU-Plenário, Acórdãos 617/2003-TCU-1ª Câmara e 3.146/2004-TCU-1ª Câmara, entre outros.
5. Igualmente incabíveis as exigências de que a licitante possua, em seu quadro de funcionários, responsável técnico detentor de atestado de responsabilidade técnica e a vistoria dos locais e dos equipamentos seja realizada por responsável técnico da licitante, por acarretar um ônus desnecessário às licitantes e mostrar-se excessiva e limitadora à participação de eventuais interessados no certame, o que é vedado pelo art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei 8.666/1993. O essencial, para a Administração, é que este profissional esteja em condições de efetivamente desempenhar seus serviços no momento da execução de um possível contrato (Acordãos 2.297/2005-TCU-Plenário, 361/2006-TCU-Plenário e 2.028/2006-TCU-1ª Câmara).
6. Quanto à exigência de visto do registro da empresa junto ao CREA/MG ainda na fase de habilitação, impende ressaltar que se a Lei 5.194/1966, que regula o exercício das profissões de engenheiro, arquiteto e engenheiro agrônomo, estabelece em seu art. 58 que o visto se faz necessário no momento do exercício da atividade, que somente ocorrerá com a contratação, e não na licitação, não há como a Administração solicitar a apresentação de visto como requisito de qualificação técnica sem que incorra no comprometimento do caráter competitivo do certame (Acórdão 1.768/2008-TCU-Plenário).
7. No que se refere à exigência de atestados de capacidade técnica em quantidades superiores ao objeto licitado, consta do edital que a prova da capacidade técnica deve ser feita mediante a apresentação de atestados que comprovem a aptidão da licitante em diversos itens de serviço, em edificações que totalizem uma área mínima de mais de onze mil metros quadrados.
8. Todavia, consta do projeto básico, disponibilizado no sítio comprasnet.gov.br, que o serviço atenderá às agências do INSS, localizadas nas cidades de Alfenas, Boa Esperança, Campo Belo, Caxambu, Lavras, São Lourenço, Três Corações, Três Pontas e Varginha, que contam com uma área total inferior a dez mil metros quadrados.
9. Cabe ressaltar que é entendimento deste Tribunal que a exigência de comprovação de experiência na execução de serviços em quantitativos que representam percentuais elevados das quantidades a executar afronta o disposto no art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei 8.666/1993, em consonância com o Acórdão 1.993/2007-TCU-Plenário. Se nessa deliberação já eram considerados excessivos percentuais que variavam entre 51,60% e 69,44%, o que dizer da exigência estabelecida na Concorrência 2/2008 de comprovação de experiência anterior em serviços de manutenção predial da ordem de 119,63% da área licitada. Como se não bastasse, a Comissão de Licitação não admitiu a soma de atestados de capacidade técnica apresentados pela representante, relativamente a serviços prestados em outras unidades do próprio INSS, contratados pelas Gerências Executivas de Contagem e Governador Valadares.
10. Diante do exposto, assiste razão aos pareceres emitidos nos autos no sentido de ter ocorrido restrição à competitividade do certame em tela. Apenas quatro empresas apresentaram os envelopes de documentação e proposta, sendo que duas delas foram inabilitadas, inclusive a representante, restando tão-somente duas propostas de preços na disputa, o que inviabiliza a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração.
...
13. Assim, e tendo em vista que os esclarecimentos prestados pela Gerência Executiva do Instituto Nacional do Seguro Social em Varginha/MG, nos termos do art. 276, § 2º, do Regimento Interno/TCU, não foram suficientes para descaracterizar as ilegalidades que maculam o procedimento licitatório objeto da presente representação, concordo os pareceres da unidade técnica quanto à fixação de prazo para que sejam adotadas as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, consistentes na anulação da Concorrência 2/2008, em observância ao disposto nos arts. 3º, § 1º, inciso I, e 49 da Lei 8.666/1993, fazendo-se ainda as determinações pertinentes.
Acórdão
...
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, em:
9.1. conhecer da presente representação, com fundamento no art. 113, § 1º, da Lei 8.666/1993, c/c o art. 237, inciso VII, do Regimento Interno/TCU, para, no mérito, considerá-la procedente;
9.2. com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, no art. 45 da Lei 8.443/1992 e no art. 251 do Regimento Interno/TCU, fixar o prazo de 15 (quinze) dias, a partir do recebimento da comunicação deste Acórdão, para que a Gerência Executiva do Instituto Nacional do Seguro Social em Varginha/MG adote as providências administrativas necessárias ao exato cumprimento da Lei, no sentido de promover a anulação da Concorrência 2/2008, em obediência ao disposto nos arts. 3º, § 1º, inciso I, e 49 da Lei 8.666/1993, em vista da inclusão no edital das seguintes exigências, para fins de habilitação, que configuram restrição ao caráter competitivo do certame:
9.2.1. somente poderão participar da licitação as empresas devidamente cadastradas e habilitadas parcialmente no SICAF;
9.2.2. a licitante possua, em seu quadro de funcionários, o responsável técnico detentor de atestado de responsabilidade técnica;
9.2.3. visto do registro da empresa junto ao CREA/MG;
9.2.4. atestado de capacidade técnica em quantidades superiores ao objeto licitado;
9.2.5. não admissão da soma dos atestados de capacidade técnica;
9.3. determinar ao Serviço de Engenharia e Patrimônio da Gerência Regional II do INSS que, em futuros procedimentos licitatórios, não inclua nos editais cláusulas que comprometam a competitividade do certame, tais como as exigências de habilitação acima referidas;
9.4. determinar à Secex/MG que monitore o cumprimento das determinações contidas na presente deliberação.”

Que esse tipo de análise sirva para as empresas aprenderem um pouco mais quanto à atenção que deve ser diligenciada ao analisar-se o conteúdo de um edital.
(TCU, Acórdão 1735/2009, Plenário, Publicação: Ata 31/2009, Sessão 05/08/2009, Aprovação 06/08/2009, DOU 07/08/2009).

Nenhum comentário:

Arquivo do blog

Quem sou eu

Minha foto
Advogado, palestrante, professor especialista em Direito Administrativo (com ênfase na matéria licitações públicas e concursos públicos), escritor e Doutor no Curso de "Doctorado en Ciencias Jurídicas y Sociales" da UMSA - Universidad del Museo Social Argentino, em Buenos aires. Ex-Coordenador Acadêmico Adjunto do Curso de Pós-Graduação em Direito Administrativo e Gestão Pública do IMAG/DF - Instituto dos Magistrados do Distrito Federal. Para contatos: Brasília -DF, tel. 61-996046520 - emaildojuan@gmail.com