quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Certificado de boas práticas? O que não está na lei não pode ser exigido

É princípio básico da Administração, decorrente de comando constitucional (art. 5º, II), que não podem ser criadas exigências por meros atos administrativos, especialmente pelos tantos abusos que se observa serem cometidos por tantos administradores públicos Brasil afora.

Exigir-se de licitantes um tal CERTIFICADO DE BOAS PRÁTICAS, sem que tal esteja especificado em lei é, no mínimo um abuso contra o princípio da competitividade, vital para a existência de certames licitatórios.

Em certo julgado o TCU já se manifestou a respeito dizendo que a exigência de certificado de boas práticas de fabricação não se coaduna com os requisitos de habilitação previstos na Lei 8.666/1993. E que o art. 30 da Lei nº 8.666/93 enumera os documentos que poderão ser exigidos para fim de comprovação da qualificação técnica, entre os quais não se incluem certificados de qualidade, tendo determinado o TCU, no caso, que o Ministério da Saúde excluísse de um edital de um pregão a exigência do certificado de boas práticas de fabricação, por absoluta falta de amparo legal, bem como por não se mostrar indispensável à garantia do cumprimento das obrigações a serem pactuadas. (Ac. 392/2011-Plenário; Sessão de 16.02.2011).

Somos dessa mesma opinião, pois o que não está em lei (em sentido formal) não pode ser exigido.

Veja-se, inclusive, que consta da Súmula 222 do TCU que as decisões do Tribunal de Contas da União, relativas à aplicação de normas gerais de licitação, sobre as quais cabe privativamente à União legislar, devem ser acatadas pelos administradores dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

A respeito de exigências em edital, o ilustre Marçal Justen Filho já disse que o elenco dos arts. 28 a 31 deve ser reputado como máximo e não mínimo. Ou seja, não há imposição legislativa a que a Administração, a cada licitação, exija comprovação integral quanto a cada um dos itens contemplados nos referidos dispositivos. O edital não poderá exigir o mais do que ali previsto. Mas poderá demandar menos. (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 11º Ed, São Paulo: Dialética, 2005, p. 306).

Demais disso, é a própria Lei 8.666 que impõe sua estrita observância, ao determinar que é vedado aos agentes públicos admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato (art. 3º, §1º, inc. I da Lei 8.666).

Anote-se por último que nessa linha, o TCU sedimentou o entendimento de que o Edital não pode conter restrições ao caráter competitivo do certame, tais como a proibição do envio de documentos por via postal, exigência de balanços patrimoniais do próprio exercício da licitação, exigência de comprovação da capacidade de comercialização no exterior e de certificado profissional, em caso de profissão não regulamentada (Ac. 1.522/2006, Plenário); exigências essas que não encontram respaldo legal.

Ressaltamos que nosso posicionamento visa evitar que, pouco a pouco, o administrador e órgãos públicos se substituam ao legislador, único verdadeiramente autorizado a estabelecer novas regras, por meio de leis, criadas e aprovadas por aquele que as estabelece em nome do povo como um todo.

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Advogado, palestrante, professor especialista em Direito Administrativo (com ênfase na matéria licitações públicas e concursos públicos), escritor e Doutor no Curso de "Doctorado en Ciencias Jurídicas y Sociales" da UMSA - Universidad del Museo Social Argentino, em Buenos aires. Ex-Coordenador Acadêmico Adjunto do Curso de Pós-Graduação em Direito Administrativo e Gestão Pública do IMAG/DF - Instituto dos Magistrados do Distrito Federal. Para contatos: Brasília -DF, tel. 61-996046520 - emaildojuan@gmail.com